quarta-feira, 1 de abril de 2015

CONSIDERAÇÕES SOBRE A DESISTÊNCIA DA AÇÃO NO PROCESSO CIVIL

INTRODUÇÃO - APRESENTAÇÃO DE UMA ANGÚSTIA

O presente texto, assim como os anteriormente postados nesta página, foi redigido de forma estritamente técnica, sem a manifestação, em seu conteúdo, de quaisquer preferências políticas particulares. Porém - e especialmente desta vez -, a motivação para escrever algumas linhas sobre o presente tema (desistência da ação no processo civil) teve início em uma angústia pessoal.
Ocorre que, ainda ontem, recebi intimação acerca de uma decisão interlocutória, proferida por juiz de uma das comarcas em que atuo, decisão esta com que o referido magistrado indeferiu um pedido de desistência formulado nos autos, sob o fundamento de que, ipsis litteris, "já foi determinada a citação da parte ré" (nada obstante ainda não tivesse o réu sido efetivamente citado e, muito menos, apresentado contestação).
Ora, tal decisão judicial é simplesmente absurda! [Salvo na hipótese de o referido magistrado, sapientíssimo que é - e talvez tomado pelo espírito de Alfredo Buzaid -, ter editado um Código de Processo Civil próprio, vigente apenas nas dependências da vara judicial de que é titular].
Todavia, ante ao idêntico absurdo da hipótese acima veiculada, devemos esclarecer que o magistrado em questão equivocou-se redondamente em seu decidir.
E, justamente com o fito de se prevenirem futuros equívocos quanto ao tema (posto que equívocos dessa natureza, além de serem propícios a causar dano à parte requerente, demandam o dispêndio de tempo e dinheiro com o manejo de recursos que possibilitem a correção do error in procedendo perpetrado pelo juiz), entendi por bem gastar algumas linhas para fazer singelas considerações sobre a desistência da ação no processo civil e as regras a ela pertinentes.
Vamos, pois, à análise do tema proposto:

1. DESISTÊNCIA DA AÇÃO - CONCEITO E DISTINÇÕES

A desistência da ação, segundo conceito dado por CHIOVENDA[1], é "a declaração da vontade de pôr fim à relação processual sem uma sentença de mérito". Ou seja, é a manifestação, feita pela parte autora, do interesse de desistir da ação por ela proposta sem que seja proferida sentença que resolva a lide objeto do processo.
Não por outro motivo, o sistema processual civil brasileiro culminou por inserir a desistência da ação no rol de situações que ensejam a prolação de sentença meramente terminativa (ou seja, sem resolução de mérito), a teor do que já dispunha o artigo 267, VII, do Código de Processo Civil de 1973[2], cujo conteúdo foi mantido pelo artigo 485, VIII, do novo Código[3].
Tem-se que a desistência é uma contramanifestação do direito de ação, como bem assinala CARNELUTTI[4]: "como a lei deixa à parte a iniciativa do processo, colocando à sua disposição a ação, assim lhe atribui também a faculdade de desistir de tal iniciativa".
Daí concluir-se que apenas a parte autora pode desistir. Ora, sendo a demanda movida pelo autor, a desistência da pretensão inicial apenas por ele pode ser veiculada. Aliás, consistiria em absurdo teratológico a eventual possibilidade de o réu desistir da ação proposta pelo autor, já que, com isto, estar-se-ia admitindo a disposição, por um indivíduo, de um direito subjetivo de outrem (o direito de ação do autor).
Dessa forma, não se admite desistência da ação por parte do réu - salvo quando se tratar de reconvenção, posto que o réu, quanto à reconvenção (que tem natureza de ação processual), assume a posição de autor[5]. Vale dizer, o reconvinte é um demandante, podendo desistir dessa demanda que iniciou (no caso, a reconvenção).
Ademais, consoante o nosso ordenamento jurídico processual civil[6], a desistência da ação não produz efeitos imediatos, ou seja, a mera manifestação de desistência pela parte autora não culmina na extinção do processo sem resolução do mérito. É necessário o preenchimento de uma condição: a homologação da desistência pelo juiz.
Isto porque, como bem salienta THEODORO JÚNIOR[7], "a relação processual não envolve apenas as partes, mas também o juiz, que, por isso, não pode ficar estranho ao ato extintivo". Assim, apenas com a homologação, o juiz, reconhecendo a desistência, finaliza a ação sem decidir seu mérito.
É mister frisar também que a desistência tem caráter unicamente processual, não atingindo o direito material da parte. Finda-se, com ela, tão somente o processo, sem que seja extinto o direito substantivo debatido na lide, que, assim, poderá ser futuramente discutido em nova ação processual.
Urge, pois, não confundir a desistência da ação com a renúncia ao direito, esta, sim, consistente na abdicação do direito material pela parte, o que a impede de ingressar posteriormente em juízo para, novamente, pleitear a tutela de tal direito, do qual abriu mão.
Como esclarece THEOTONIO NEGRÃO[8]:
A desistência da ação não importa renúncia ao direito. Por isso, a sentença homologatória de desistência da ação não impede o ajuizamento de nova demanda contra o réu, visando ao mesmo objetivo.
Aliás, essa ideia é corroborada pelo fato de que a desistência é causa de extinção do processo sem resolução de mérito, motivo pelo qual não faz coisa julgada material (senão meramente formal); ao passo que a sentença homologatória da renúncia é resolutiva de mérito, perfazendo coisa julgada material[9].

2. MOMENTO EM QUE SE ADMITE A DESISTÊNCIA DA AÇÃO. A UNILATERALIDADE DA DESISTÊNCIA MANIFESTADA ANTES DA CONTESTAÇÃO

O objetivo primordial da desistência da ação, como visto, é a extinção do processo sem a análise do mérito, ou seja, sem que seja proferida decisão judicial que confira solução à lide levada a juízo e, assim, distribua o direito entre as partes.
Dessa forma, é de cunho eminentemente lógico a conclusão de que a desistência apenas é admitida antes da prolação da sentença. Ou seja, pode a parte desistir da ação em qualquer momento do processo, contanto que anteriormente à sentença de primeiro grau.
Ora, proferida a sentença, resta esgotada a finalidade da desistência!
Isto se percebe de forma mais clara quando se leva em consideração a sentença definitiva, posto que, ao resolver o mérito, torna impossível qualquer pretensão de extinção do feito sem a referida resolução. Mas, também em sendo proferida sentença terminativa, cessa à parte o direito de desistir da ação, já que o escopo de se obter uma extinção do processo sem resolução de mérito já foi alcançado por fatores diversos.
Após a sentença, admite-se tão somente a desistência de eventual recurso interposto, o que não se confunde com a desistência da ação, já que aquela não extingue o processo sem a resolução do mérito, senão apenas faz transitar em julgado, de imediato, a sentença anteriormente proferida.
Esse entendimento encontrava-se, já há muito, consagrado pela doutrina e pela jurisprudência, consoante se pode depreender da lição de THEODORO JÚNIOR[10], para quem:
O limite temporal do direito de desistir da ação é a sentença, de sorte que não é concebível desistência da causa em grau de apelação ou outro recurso posterior, como os embargos infringentes e o recurso extraordinário. (...) se a causa está pendente de recurso interposto pelo autor, pode este desistir do recurso, mas não pode desistir da ação. Com a desistência do recurso opera-se o trânsito em julgado da decisão recorrida; com a desistência da ação, far-se-ia cair a decisão de mérito.
Incorporando esse consolidado posicionamento, estipulou também o novo Código de Processo Civil, em seu artigo 485, §5º, o momento da sentença como limitação ao direito de desistência, ao dispor que "a desistência da ação pode ser apresentada até a sentença".
Assim, antes de proferida a sentença, pode o autor, a qualquer momento, desistir da ação por ele proposta, desistência esta que, como analisado anteriormente, produzirá efeitos apenas a partir de sua homologação judicial.
Porém, a depender do momento em que o autor manifestar sua desistência, pode esta ficar condicionada a mais um requisito: o consentimento do réu; isto porque a relação processual, quando aperfeiçoada, tem em sua composição também o réu, que, assim como o autor, possui direito à prestação jurisdicional. Segundo os dizeres de CHIOVENDA[11], o réu "tem direitos iguais ao autor, particularmente, o direito de pedir a sentença de mérito".
Como se sabe, com a apresentação da petição inicial pelo autor, surge uma relação jurídica processual, composta, inicialmente, de apenas dois sujeitos: o autor e o juiz. A relação processual se inicial, portanto, de modo bilateral e linear.
Mas, ao processo, mormente ante a garantia do contraditório (que é legitimadora da prestação jurisdicional), não basta que seja integrado apenas por autor e juiz, sendo, pois, indispensável a presença do réu, o que se faz possível mediante sua citação - posto que, como já bem ensinava CARNELUTTI[12]: "se bem que não seja impossível, o comparecimento espontâneo não corresponde desde já à regra geral" -.
Desse modo, com a efetivação da citação do réu, passa este a também integrar o processo, completando-se a relação processual, que, a partir de então, torna-se trilateral e triangular (autor, réu e juiz). Fala-se, assim, que a citação do réu angulariza a relação jurídica processual.
Segundo ensina MONTENEGRO FILHO[13], "o ingresso da petição inicial em juízo origina uma relação bilateral, estabelecida entre o autor e o juiz, reclamando o aperfeiçoamento da citação do réu para a angularização dessa relação, estabelecendo-se, após isso, uma relação entre o autor, o juiz e o réu".
Quando o réu passa a integrar o processo, surge a ele o direito de neste influir, motivo pelo qual, a partir da citação, ocorre a chamada estabilização da demanda, que impede o autor de, sem o consentimento do réu, alterar o pedido ou a causa de pedir expostos na petição inicial. O aditamento da inicial, portanto, só pode ser feito unilateralmente pelo autor até o momento da citação do réu. Eis a regra contida no artigo 329 do novo Código de Processo Civil[14], que apenas manteve a disposição já constante do artigo 264 do Código de 1973[15].
Daí, tendo em vista ser necessário, a partir da citação, o consentimento do réu para que o autor modifique a petição inicial, o intérprete desatento poderia imaginar que, com a citação, também a desistência da ação dependeria do assentimento exarado pelo réu.
Nada obstante tal raciocínio pudesse ter alguma lógica, está completamente equivocado!
Ocorre que, quanto à exigência de consentimento do réu para a desistência da ação, o sistema processual civil brasileiro - tanto no Código Processual de 1973 (artigo 267, §4º[16]), como no novo Código de Processo Civil (artigo 485, §4º[17]) - adota critério diferente do da citação, qual seja: o oferecimento de resposta pelo réu.
Por este critério, tem-se que o autor apenas necessita do consentimento do réu para desistir da ação a partir do momento em que este apresentar a sua resposta - o que, numa interpretação a contrario sensu, significa que tem o autor o direito de desistir unilateralmente da ação (ou seja, independentemente do consentimento do réu) até que seja apresentada a peça de defesa.
Nesse sentido, leciona magistralmente ERNANE FIDÉLIS DOS SANTOS[18]:
Formada que fosse a relação processual, o lógico seria a impossibilidade de desistência sem o consentimento do réu. Mas a lei foi mais à frente e admitiu a possibilidade de desistência até que decorra o prazo de resposta, levando em conta que, até referido momento, não se pode deduzir qual seja a intenção do réu, à frente do processo.
É mister, portanto, não confundir o aditamento unilateral da petição inicial com a desistência unilateral da ação: (a) quanto ao aditamento, será unilateral apenas até o momento da citação do réu (em que ocorre a estabilização da demanda); ao passo que, (b) no que se refere à desistência da ação, haverá unilateralidade até o momento da apresentação da contestação pelo réu.
Conclui-se, assim, que, ainda que citado o réu, se não tiver ainda apresentado contestação, tem o autor o direito de, unilateralmente - frise-se, sem o consentimento do réu -, desistir da ação, cabendo ao juiz homologar a desistência, extinguindo o processo sem resolução de mérito.
Porém, a partir da apresentação da contestação, torna-se a desistência da ação um ato bilateral, restando indispensável, para sua concretização, o assentimento do réu: caso este aceite a desistência, caberá ao juiz homologá-la; se discordar, entretanto, não poderá o juiz proceder à homologação.
E o fundamento dessa posterior bilateralidade é simples: segundo já explanado, o réu, como parte processual que é, também tem direito à prestação jurisdicional, podendo ser-lhe mais adequado, por algum motivo, continuar a ação que já se encontra em andamento, caso em que lhe é facultado dissentir da desistência manifestada pelo autor.
Assim, a lição de CÂMARA[19]:
Tal regra se explica pelo fato de que o demandado, tanto quanto o demandante, exerce no processo seu poder de ação, e tem direito de postular tutela jurisdicional em seu favor. Assim, no caso de já terem ambas as partes dado início ao exercício do poder de ação, só se poderá extinguir o processo por desistência se ambas tiverem desistido.
Por fim, frise-se que, nada obstante possa o réu discordar da desistência, deve fazê-lo de modo adequadamente fundamentado. Ocorre que cabe ao juiz analisar os motivos do dissentimento exposto pelo réu, de modo a considerá-los apenas caso se mostrem razoáveis. Nessa esteira, afirma RIOS GONÇALVES[20] que "a discordância do réu quanto ao pedido de desistência há de ser fundamentada, não podendo ele opor-se injustificadamente".

3. REPROPOSITURA DA AÇÃO DESISTIDA E DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA

Conforme analisado ainda no primeiro item deste texto, a parte que, desistindo da ação, obtiver, com sua homologação, a extinção do feito sem resolução do mérito, poderá propor novamente a mesma ação, tendo em vista que a desistência não gera abdicação ao direito substancial debatido na lide, e que, na ação desistida, não há formação de coisa julgada material.
Deve-se clarear, porém, que, extinta uma ação por desistência, posto não haver julgamento de mérito, sua posterior repropositura ensejará distribuição por dependência, consoante disposição que já constava do artigo 253, II, do Código de Processo Civil de 1973[21], mantida, agora, pelo artigo 286, II, do novo Codice[22].
Desse modo, a nova ação será distribuída obrigatoriamente à mesma vara judicial em que tramitou a ação anterior extinta em virtude da desistência, medida esta que tem por objetivo impedir que o autor da ação se valha de meios escusos para conseguir a tutela que busca com o processo.
Isto porque, como bem se sabe, ante a ausência de uma uniformidade de entendimento no Poder Judiciário, atualmente existe verdadeira "loteria judiciária" (também denominada "jurisprudência lotérica"[23]): uma mesma ação, com mesma causa de pedir e pedido, pode ter provimentos totalmente distintos a depender da comarca e da vara para a qual for distribuída.
E exatamente por isso obsta-se que o possa o indivíduo, fazendo uso dessa pluralidade de entendimentos judiciais, desistir e repropor a ação tantas vezes quanto o necessário para que, finalmente, seja ela distribuída a uma vara judicial cujo entendimento aponte pela procedência de seu pleito.
Nesse sentido, asseveram MARINONI e ARENHART[24] que "o objetivo dessa norma foi exatamente o de impedir ao autor desistir da ação e, após, ver a mesma ação distribuída a outro juiz", já que em tempos passados, conforme apontam os mesmos autores, "a prática passou a assistir a um fenômeno curioso: após a distribuição da petição inicial a um juiz não favorável à sua pretensão, o autor deixava de pagar as custas do processo - e assim permitia a extinção do processo - ou desistia da ação, para então propor novamente a ação e ter a oportunidade de vê-la distribuída a outro juiz".
Por esses fundamentos, a ação extinta por desistência, quando reproposta, deve ser distribuída por dependência ao mesmo órgão judicial em que tramitou a ação anterior desistida.
Porém, excedendo um pouco o objeto do presente texto, aproveito a oportunidade para tecer uma crítica ao referido sistema:
De fato, se não se estipulasse a distribuição por dependência aos caso de extinção da ação anterior sem resolução de mérito, estar-se-ia dando margem a que os jurisdicionados burlassem intencionalmente a imparcial alternatividade da distribuição.
Ocorre que essa medida não seria necessária se houvesse uniformidade de entendimento pelo Poder Judiciário, posto que, nesse caso, a distribuição do direito seria igualitária em todas as varas judiciais, de modo a ser indiferente a vara a que fosse distribuída a ação.
Perceba-se que a uniformização de entendimento (possível, por exemplo, mediante a adoção de um sistema de precedentes judiciais vinculantes[25]), longe de dúvidas, é meio apto não apenas a impedir essas violações na distribuição das ações, mas, verdadeiramente, a garantir maior coerência, segurança jurídica e igualdade de tratamento aos indivíduos que se utilizam do serviço jurisdicional. Seria, pois, uma solução global (e não meramente específica, como é o caso da distribuição por dependência quando da extinção sem resolução de mérito).
Ora, sendo assim, melhor seria que, ao invés de criar meios para resolver individualmente cada um dos problemas do processo judicial, buscasse o legislador melhorar o sistema como um todo, mormente ante a ampliação e melhor regulamentação de instrumentos que objetivassem a uniformização de entendimento judicial.

4. DESISTÊNCIA PARCIAL DA AÇÃO

A desistência da ação, apesar de comumente ocorrer quanto a todas as partes rés do processo, pode ser manifestada quanto a apenas um ou alguns dos demandados. Ou seja, em havendo litisconsórcio passivo, o autor da ação pode dela desistir com relação a todos os réus (desistência total) ou, apenas, com relação a um ou alguns deles (desistência parcial).
No caso de desistência parcial, não se exige o consentimento de todos os corréus, senão apenas daqueles abrangidos pela desistência do autor e, ainda assim, consoante a regra geral, somente dos que já tiverem apresentado resposta (contestação) quando da manifestação de desistência pelo autor. Assim, quanto aos demandados que ainda não contestaram, bem como quanto aos não abarcados pela desistência parcial, é esta ato unilateral.
Daí a preleção de THEOTONIO NEGRÃO[26], para quem, em caso de litisconsórcio passivo, "a desistência da ação quanto a alguns co-réus somente exige a anuência destes, dispensando a dos demais".
A questão de maior relevo acerca da desistência parcial da ação, todavia, relaciona-se com o prazo para contestar dos litisconsortes passivos, quando houver desistência em relação a réu ainda não citado.
Isto porque o artigo 335, §2º, do novo Código de Processo Civil[27], mantendo a disposição do artigo 298, parágrafo único, do Código de 1973[28], estabelece que, na hipótese de desistência da ação contra corréu ainda não citado, o prazo para apresentação de resposta começa a correr da data da intimação acerca da decisão homologatória da desistência parcial.
Ou seja, realizada a desistência parcial unilateral em relação a litisconsorte passivo ainda não citado para a ação, o prazo para contestar terá início, para todos os demais réus, quando da intimação de cada qual deles sobre a decisão judicial que homologou a referida desistência.
Trata-se, pois, de exceção à regra geral segundo a qual o prazo para resposta é comum a todos os litisconsortes.
Conforme a lição de RIOS GONÇALVES[29]:
Quando há vários réus, o prazo de contestação só começará a correr depois que todos estiverem citados. Todavia, se houver desistência em relação a um deles, o prazo de resposta para os demais correrá da intimação da decisão que deferir a desistência, que muitas vezes terá de ser pessoal, quando os demais réus ainda não tiverem comparecido ao processo e constituído advogado.
Cabe, ainda, uma última consideração acerca da desistência parcial: esta não é possível em se tratando de litisconsórcio passivo necessário.
E a assertiva é lógica, tendo em vista que o litisconsórcio necessário é aquele em que - seja por força da lei, seja pela natureza da relação jurídica - não se admite a propositura da ação senão contra todos os legitimados passivos, posto que a eficácia da sentença depende de que todos, tendo participado do processo, sejam por ela abrangidos[30].
Nesse caso, portanto, a desistência parcial prejudicaria o litisconsórcio necessário e, assim, tornaria ineficaz a sentença.

5. DESISTÊNCIA DA AÇÃO E DIREITOS INDISPONÍVEIS

Certa celeuma há acerca da admissibilidade da desistência quando a ação em trâmite tiver por objeto direitos indisponíveis, assim entendidos aqueles direitos que não comportam transação ou abdicação por seu titular.
Surgiu, quanto ao tema, um primeiro posicionamento no sentido de que, em versando a ação judicial sobre direitos classificados como indisponíveis, não poderia a parte autora dela desistir, posto que, com tal atitude, estaria abrindo mão de um direito que não comporta abdicação.
Adepto dessa corrente de entendimento, afirma MONTENEGRO FILHO[31] que:
Há restrição da homologação do pedido de desistência quando a causa versa sobre direito indisponível, resguardado por proteção legal em favor de uma das partes do processo, ainda observada em decorrência da natureza jurídica da lide.
Porém, o referido entendimento aparenta padecer de séria falha técnica.
Ocorre que, como já exaustivamente frisado, a desistência da ação tem cunho exclusivamente processual, não gerando renúncia ao direito material objeto da ação. Assim, mesmo após a desistência da ação, o direito material continua intacto e com a mesma força de antes, não sendo relativizado, transacionado ou abdicado.
Ademais, a homologação da desistência gera sentença meramente terminativa, que, por não resolver o mérito, não faz coisa julgada material, permitindo à parte, a qualquer momento, reingressar em juízo para, em nova ação idêntica, buscar a defesa de seu interesse.
Portanto, mais adequado é entender pela aceitabilidade de desistência da ação mesmo quando esta tiver por objeto lide que envolva direitos indisponíveis. Nesse sentido, a preleção de THEOTONIO NEGRÃO[32], para quem:
Pode haver desistência de ação que verse sobre direitos indisponíveis, porque não impede o ajuizamento de nova demanda contra o réu, visando ao mesmo objetivo.

6. OUTRAS CARACTERÍSTICAS DA DESISTÊNCIA - PODERES PARA DESISTIR, CONTINUIDADE DA RECONVENÇÃO E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Inicialmente, tem-se que a desistência da ação, ante a importância das consequências processuais que gera, é ato cuja realização exige que o patrono da parte autora tenha sido por esta constituído mandatário com poderes especiais.
É justamente esta a determinação constante do artigo 38, caput, do Código de Processo Civil de 1973[33], cujo conteúdo foi mantido pelo artigo 105, caput, do novo Código Processual[34].
Ou seja, para que possa a parte desistir da ação por ela proposta, não basta que seu procurador judicial (advogado) possua, pelo instrumento de mandato que lhe fora outorgado, os poderes gerais de representação em juízo (cláusula ad judicia), sendo indispensável que possua poderes especiais, individualmente indicados na procuração, para desistir da ação (cláusula et extra).
Sobre o sentido dessa regra, e fundado no Código de Processo Civil italiano, que continha semelhante exigência (e em que o legislador brasileiro se baseou para criação de nossos códigos processuais), já se manifestava CARNELUTTI[35], ao afirmar que:
A razão de tal norma consiste em que o mandato conferido para propor a demanda não se encontra compreendido do encargo de revogá-la; outra coisa seria, o que geralmente não acontece, se este embargo tivesse conferido expressamente desde o princípio.
Assim, ausente a cláusula expressa e específica que confira ao procurador da parta poderes para desistir da ação, tal ato não poderá por ele ser praticado.
Em segundo lugar, é importante consignar que, tendo sido apresentada reconvenção pelo réu, a desistência da demanda inicial pela parte autora não gera a extinção da reconvenção, que continuará tramitando independentemente, nos termos do disposto no artigo 317 do Código de Processo Civil de 1973[36], cuja regra foi mantida pelo artigo 343, §2º, do novo Código[37].
Isto porque, como já afirmado em momento anterior, a reconvenção possui natureza jurídica de verdadeira ação judicial, apenas veiculada conjuntamente à ação originária em decorrência da ligação existente entre seus objetos.
Desse modo, ocorrida a desistência da ação anterior, apenas esta é extinta sem resolução do mérito; ao passo que a reconvenção, ação autônoma que é, não sofre qualquer abalo, prosseguindo normalmente até possível decisão de mérito.
Consoante lição de ERNANI FIDÉLIS DOS SANTOS[38] acerca da reconvenção:
Em razão de sua independência, irrelevantes tornam-se a seu prosseguimento a extinção anormal do processo principal e a desistência da ação, casos em que a reconvenção tem prosseguimento.
Por fim, uma última característica geral da desistência da ação é o efeito que esta produz no que concerne ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais.
Como regra, vigora para o pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios o princípio da sucumbência, segundo o qual a parte derrotada no processo é quem deve arcar com essas custas e honorários (e, havendo procedência parcial do pedido, as custas e honorários são rateados entre as partes). Segundo ERNANI FIDÉLIS DOS SANTOS[39], "em princípio, todas as despesas processuais, no processo de conhecimento, são pagas pelo sucumbente, que é o vencido na solução da lide".
Porém, quando há desistência da ação, excepciona-se o princípio da sucumbência. Isto porque, com a desistência, não há resolução de mérito, de modo a não se determinar qual das partes resta vitoriosa ou derrotada. A sentença homologatória da desistência apenas encerra o processo, sem qualquer pronuncia acerca de qual das partes tem razão.
Ante essa impossibilidade de aplicar-se o critério da sucumbência aos casos de desistência, nosso sistema processual resolve a questão da responsabilidade pelas despesas e honorários com base em outro princípio: o da causalidade.
Assim - consoante disposição que já constava do artigo 26 do Código de Processo Civil de 1973[40] e que foi mantida pelo artigo 90 do novo Código[41] -, havendo desistência, as verbas processuais e honorárias são da responsabilidade da parte que deu causa à extinção do processo, ou seja, o autor.
E, ainda, como forma de distribuição equânime das custas do processo, estabelecem os mesmos dispositivos que, se a desistência for parcial, a parte autora será também responsável pelas despesas e honorários advocatícios, mas apenas proporcionalmente à parcela da ação abrangida pela desistência.
Mencione-se, porém, que, quanto aos honorários advocatícios, predomina o entendimento de que apenas serão de responsabilidade da parte autora se o advogado já tiver ingressado no feito quando da desistência, ou se, mesmo anteriormente ao seu ingresso, a desistência causar prejuízo ao réu (que pode, por exemplo, já ter pago antecipadamente ao seu advogado).
Nessa esteira, ensina THEOTONIO NEGRÃO[42] que "é indevida a verba se a desistência ocorrer antes de ingressar nos autos o advogado do réu ou do executado. (...) Mas é devida se da desistência resulta prejuízo ao réu".

7. DESISTÊNCIA ANTE O JULGAMENTO DE RECURSOS REPETITIVOS

Nosso ordenamento jurídico processual estabelece um sistema de julgamento de recursos repetitivos, visando a conferir, a todas as lides que versarem sobre o mesmo tema, solução uniforme, mediante o julgamento, por amostragem, de um recurso representativo da controvérsia geradora de expressiva quantidade de recursos idênticos.
O Código de Processo Civil de 1973 apenas regula o julgamento de recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, ou seja, no âmbito de Recursos Especiais.
O novo Código de Processo Civil, porém, ampliou o sistema de julgamento de recursos por amostragem para abranger também os Recursos Extraordinários, de competência do Supremo Tribunal Federal.
E as inovações não pararam por aí: o novo Código estabeleceu um regramento mais completo à matéria, incluindo aí disposições específicas e peculiares sobre a desistência de ações de conhecimento que tiverem por objeto questão resolvida no julgamento de recursos repetitivos, consoante se pode depreender dos três parágrafos de seu artigo 1.040[43].
Segundo estipulam os referidos dispositivos do novo Código, a parte autora pode, em qualquer momento anterior à prolação da sentença (portanto, no primeiro grau de jurisdição), desistir da ação que propôs, caso nela se esteja discutindo questão idêntica à solucionada em julgamento de recursos repetitivos.
Até esse ponto, não se percebe qualquer alteração na regra geral de desistência, já que, como analisado logo ao início do presente texto, em qualquer ação cognitiva pode a parte autora manifestar sua desistência até o momento da sentença.
Porém, inova o novo Codice ao estipular que, quando a questão debatida na ação for idêntica à resolvida em julgamento de recursos repetitivos, a desistência sempre será unilateral. Ou seja: na referida hipótese, qualquer que for o momento em que o autor manifestar sua desistência (ainda que após a contestação), não necessitará do consentimento do réu para que o juiz a homologue.
Trata-se, pois, de exceção legal expressa à regra da bilateralidade da desistência estabelecida, às ações em geral, a partir da apresentação da contestação.
Por fim, o novo Código também dispôs que, ocorrendo essa situação de identificação da ação com o julgamento de recurso por amostragem, a parte autora que desistir antes de apresentada a contestação ficará isenta do pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios. Portanto, apenas terá a parte desistente a responsabilidade pelo pagamento de tais verbas se a desistência for manifestada após a contestação.
Com isso, mais uma vez o novo Código excepciona especificamente uma regra genérica, já que, na desistência de ações em geral, apesar de os honorários advocatícios apenas serem devidos com o ingresso do advogado do réu no processo, as despesas processuais são devidas desde a distribuição da petição inicial. Porém, com a disposição do artigo 1.040, §2º, do novo Código, em se tratando de ação que tenha por objeto questão decidida em julgamento de casos repetitivos, a parte autora que desistir antes da contestação fica livre até mesmo do pagamento das despesas processuais.

8. DESISTÊNCIA FACE A INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS

Continuando a análise das inovações do novo Código de Processo Civil acerca das questões ligadas à desistência de ações, encontram-se disposições muito peculiares nos §§ 1º e 2º de seu artigo 976[44], inserido no capítulo que trata do incidente de resolução de demandas repetitivas.
O incidente de resolução de demandas repetitivas consiste num mecanismo mediante o qual é escolhido um processo para ser julgado, pelo tribunal, de forma exemplar (ou seja, por amostragem), quando presentes dois requisitos: (a) repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; e (b) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
Assim, dentre as várias demandas que versam sobre a mesma questão exclusivamente de direito, uma é remetida - pelas partes, pelo juiz (em primeiro grau), pelo relator (em grau recursal), pelo Ministério Público ou, ainda pela Defensoria Pública - para julgamento por tribunal de segunda instância (TJ ou TRF).
Fixado esse conceito, cabe agora analisar as regras concernentes à desistência no referido incidente.
Conforme estipula o novo Código, a desistência por parte do autor da ação em que foi instaurado o incidente de resolução de demandas repetitivas não obsta o prosseguimento do incidente e o final exame de seu mérito.
Ora, não obstante tenha suporte em um determinado processo, o incidente veicula um interesse que excede o simples interesse das partes. Por ter a finalidade de resolver uma questão amplamente debatida em ações manifestamente repetidas, há, no incidente, um verdadeiro interesse social, da coletividade.
Assim, a desistência da parte, por operar no interesse particular, não pode afetar o prosseguimento e o final julgamento do incidente, cuja motivação é um interesse social, que não pode ser afastado em virtude de mero interesse privado.
Não por outro motivo, o novo Código também dispõe que, em havendo essa desistência, deve o Ministério Público, obrigatoriamente, intervir no incidente e assumir sua titularidade (seu pólo ativo), caso não seja ele já coautor da referida ação. Isto porque o Ministério Público tem a qualidade de fiscal da lei (custos legis) e de defensor do interesse social e público, cabendo, pois, a ele, dar prosseguimento ao incidente de resolução de demandas repetitivas, em caso de desistência da parte autora originária.
Aliás, vale mencionar que disposição semelhante já era encontrada na Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985 - artigo 5º, §3º[45]), que dispõe que, havendo desistência infundada ou abandono da ação civil pública por algum de seus legitimados, deve o Ministério Público, ou mesmo outro legitimado, assumir o pólo ativo e prosseguir com a referida ação.
E o fundamento, mutatis mutandis, reside igualmente no interesse social quanto ao provimento final de mérito da ação civil pública - já que esta versa sobre direitos transindividuais (direitos difusos ou coletivos) ou, ao menos, sobre direitos individuais que dizem respeito a uma expressiva quantidade de indivíduos (direitos individuais-homogêneos).

9. DESISTÊNCIA NA EXECUÇÃO

Tendo sido tratado, nos tópicos anteriores, sobre a desistência da ação no processo de conhecimento, cabe, por fim, separar este último subtítulo do presente texto para proceder a uma breve análise da desistência no processo de execução, apontando suas regras específicas.
Inicialmente, tem-se que, do mesmo modo que no processo de conhecimento, admite-se a desistência no processo de execução.
Na execução, porém, a desistência não tem por objetivo a prolação de uma sentença sem resolução de mérito, já que não há mérito a ser resolvido, de forma que a sentença proferida ao término do procedimento executório sempre será terminativa. Como se sabe, o objetivo da execução é outro: a satisfação de uma obrigação constante de título executivo.
Assim, no processo de execução, a desistência tem por finalidade tão somente encerrar a atividade judicial executória, obstando-se a satisfação da obrigação executada. E, também no processo de execução, a desistência produz efeitos meramente processuais, não afetando o direito material do exequente de ver satisfeita a obrigação a cujo cumprimento faz jus.
Mas a primordial diferença entre a desistência no processo de conhecimento e a desistência no processo de execução localiza-se na necessidade ou não de consentimento da parte contrária:
No processo de conhecimento, conforme já analisado, a desistência da ação é unilateral apenas até o momento da apresentação da contestação pelo réu, após o que é indispensável o consentimento deste para que possa o juiz homologar a desistência e extinguir o processo.
No processo de execução, por outro lado, a desistência é sempre unilateral. Ou seja, o exequente poderá desistir da execução em qualquer momento (antes, é claro, da satisfação da obrigação), sendo absolutamente irrelevante o consentimento do executado. Ocorre que a lei estabelece a desistência da execução como uma faculdade do credor, não a condicionando ao assentimento do devedor[46]. Daí dizer-se (frisando) que a desistência, na execução, é ato unilateral da parte exequente.
Unindo todas essas características, ensina BERNARDO PIMENTEL SOUZA[47] que, no processo de execução, "a desistência é o ato unilateral de vontade por meio do qual o exequente abdica da execução em curso, mas não do direito material subjacente".
Porém, a análise da questão comporta ainda um desdobramento.
Ocorre que, nada obstante desnecessária a concordância do devedor para a desistência do pleito executório, tem-se que seu assentimento pode ser necessário para que essa desistência se estenda também a eventuais embargos à execução por ele opostos.
Em outros termos: em determinadas situações, a desistência da ação de execução não acarretará a extinção automática dos embargos executórios apresentados pelo devedor, sendo necessário, para tanto, o consentimento deste.
A essas hipóteses referem-se os artigos 569, parágrafo único e alíneas, do Código de Processo Civil de 1973[48] e 775, parágrafo único e incisos do novo Código de Processo Civil[49], ambos veiculando as mesmas disposições.
Segundo a regra constante de ambos os dispositivos, se os embargos à execução opostos pelo devedor versarem tão somente sobre matéria processual (a exemplo da ilegalidade de uma penhora realizada ou da ausência de legitimidade para a execução), a desistência da execução alcançará imediatamente os embargos do devedor, extinguindo-os sem resolução de mérito, independentemente do consentimento do executado embargante. Nessa hipótese, a extinção dos embargos ocorre de modo automático e unilateral.
Por outro lado, se os referidos embargos tratarem de outros assuntos que não questões processuais - ou seja, se impugnarem diretamente o título executivo em que se baseia a execução -, a desistência da execução apenas os extinguirá se com isto o devedor embargante concordar. Nessa hipótese, portanto, a extinção dos embargos não é automática, sendo condicionada à aceitação do executado (é, pois, bilateral).
Como bem sintetiza BERNARDO PIMENTEL SOUZA[50]:
Os processos de execução e de embargos são extintos, às custas do exequente, se os embargos versarem apenas sobre questões processuais; se os embargos versarem sobre questões de mérito, há a extinção da execução, mas a homologação da desistência dos embargos depende da anuência do executado embargante.
Mencione-se, por fim, que, em todos os casos, o pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios relativos à execução e aos embargos do devedor, por força do princípio da causalidade, é de responsabilidade do exequente que desistiu da execução (dando, assim, causa à extinção desta e dos embargos).

CONCLUSÕES

Ante todo o exposto, cabe concluir, de forma sintetizada, que:
- A desistência da ação, como meio de extinção do processo sem resolução do mérito, é um direito do autor, a ser exercido antes da sentença, e que é unilateral até o momento da apresentação da contestação pelo réu. Sua eficácia depende de homologação judicial e, após a contestação, também do consentimento do réu.
- Tem efeitos meramente processuais, não resultando na renúncia ao direito material debatido no processo, motivo pelo qual pode a mesma ação ser novamente proposta, caso em que será distribuída por dependência ao mesmo órgão jurisdicional perante o qual tramitou a ação extinta pela desistência.
- Em havendo litisconsórcio passivo (salvo o litisconsórcio necessário), a desistência pode ser parcial, abrangendo apenas um ou alguns dos corréus, caso em que, se requerida após a apresentação da contestação, dependerá do assentimento apenas dos demandados por ela abarcados. Ademais, se houver desistência antes da citação de algum corréu, o prazo para os demais contestarem será contado a partir da intimação de cada qual deles acerca da decisão homologatória da desistência.
- A desistência pode ocorrer mesmo quando a ação versar sobre direitos indisponíveis.
- O procurador da parte apenas pode desistir da ação se lhe forem expressamente conferidos poderes especiais para tanto.
- A desistência da ação não afeta a reconvenção, ante o caráter autônomo desta.
- Extinto o processo pela desistência, o pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios é de responsabilidade do autor, com base no princípio da causalidade. Quanto aos honorários advocatícios, entretanto, tem-se que apenas serão devidos se a desistência for manifestada após o ingresso do procurador do réu no processo ou quando, ainda que antes de tal ingresso, a desistência causar prejuízo ao réu. Ademais, se a desistência for parcial, os valores a serem pagos pelo autor serão proporcionais à parcela desistida da ação.
- Quando a ação versar sobre questão idêntica à resolvida em julgamento de recursos repetitivos, conforme o novo Código de Processo Civil, a desistência pelo autor, ainda que posterior à apresentação da contestação, é unilateral, não dependendo do consentimento do réu. Outrossim, se a desistência for manifestada antes de oferecida a contestação, fica o autor isento não apenas dos honorários advocatícios, mas também das despesas processuais.
- Em sendo instaurado incidente de resolução de demandas repetitivas, consoante disposições do novo Código de Processo Civil, a desistência do autor com relação à ação não impede o prosseguimento e o julgamento de mérito do incidente. Aliás, havendo desistência, deve o Ministério Público intervir e assumir o pólo ativo do incidente, garantindo, assim, seu adequado prosseguimento.
- No processo de execução também é admitida a desistência, que será sempre unilateral quanto à própria ação de execução. Nada obstante, em tendo sido opostos embargos à execução, a desistência da ação executória apenas extinguirá automaticamente os embargos se estes versarem sobre questões processuais. Caso os embargos tratem sobre matéria de mérito (ou seja, caso impugnem o título em que se funda a execução), a extensão dos efeitos da desistência da ação aos embargos fica condicionada ao assentimento do executado embargante. Em todas as situações, porém, o pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios - da execução e dos embargos - é de responsabilidade do exequente, ante o princípio da causalidade.
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[1] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Tradução de Paolo Capitanio. 4ª edição. Campinas: Bookseller, 2009, p. 1.163.
[2] "Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (...) VII- quando o autor desistir da ação".
[3] "Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) VIII- homologar a desistência da ação".
[4] CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, volume IV. Tradução de Hiltomar Martins Oliveira. 2ª edição. São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, p. 675.
[5] Nesse sentido, manifesta-se a literatura jurídica: "Ao contrário da contestação, que é simplesmente resistência à pretensão do autor, a reconvenção é um contra-ataque, uma verdadeira ação ajuizada pelo réu (reconvinte) contra o autor (reconvindo), nos mesmos autos". [THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, volume I - teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 37ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 344].
Ademais, como preceitua a doutrina, na reconvenção "torna-se o réu também autor e passa a chamar-se réu-reconvinte". [SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de direito processual civil, volume 01 - processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 389].
[6] Nos termos do artigo 158, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973, cujo conteúdo foi reproduzido pelo artigo 200, parágrafo único, do novo Código Processual:
"Art. 158. (...) Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeito depois de homologada por sentença".
"Art. 200. (...) Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial".
[7] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, volume I - teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 37ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 278.
[8] NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 30ª edição. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 325.
[9] O nosso sistema processual civil sempre consagrou a sentença homologatória de renúncia como decisão que resolve o mérito. Assim se pode depreender do artigo 269, V, do Código de Processo Civil de 1973, cujo conteúdo foi mantido pelo artigo 487, III, c, do novo Código Processual:
"Art. 269. Haverá resolução de mérito: (...) V- quando o autor renunciar ao direito sobre que a ação se funda".
"Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: (...) III- homologar: (...) c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção".
[10] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, volume I - teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 37ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 278.
[11] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Tradução de Paolo Capitanio. 4ª edição. Campinas: Bookseller, 2009, p. 1.164.
[12] CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, volume IV. Tradução de Hiltomar Martins Oliveira. 2ª edição. São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, p. 29.
[13] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil, volume I - teoria geral do processo e processo de conhecimento. 8ª edição. São Paulo: Atlas, 2012, p. 191.
[14] "Art. 329.  O autor poderá: I- até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu; II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar. Parágrafo único.  Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir."
[15] "Art. 264. Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei. Parágrafo único. A alteração do pedido ou da causa de pedir em nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo."
[16] "Art. 267. (...) §4º Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação".
[17] "Art. 485. (...) §4º Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação."
[18] SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de direito processual civil, volume 01 - processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 524.
[19] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume I. 18ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 291.
[20] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 01 - teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 9ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 281.
[21]"Art. 253. Distribuir-se-ão por dependência as causas de qualquer natureza: (...) II- quando, tendo sido extinto o processo, sem julgamento de mérito, for reiterado o pedido, ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam parcialmente alterados os réus da demanda".
[22] " Art. 286. Serão distribuídas por dependência as causas de qualquer natureza: (...) II- quando, tendo sido extinto o processo sem resolução de mérito, for reiterado o pedido, ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam parcialmente alterados os réus da demanda".
[23] O referido termo é utilizado por EDUARDO CAMBI, que ensina que "a idéia da jurisprudência lotérica" se refere à situação em que "a mesma questão jurídica é julgada por duas ou mais maneiras diferentes". Por consequência dela, segundo o autor, "se a parte tiver a sorte de a causa ser distribuída a determinado Juiz, que tenha entendimento favorável da matéria jurídica envolvida, obtém a tutela jurisdicional; caso contrário, a decisão não lhe reconhece o direito pleiteado". [CAMBI, Eduardo. Jurisprudência lotérica. In: Revista dos Tribunais volume 786. São Paulo: Revista dos Tribunais, abril de 2001, p. 111].
[24] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil, volume 02 - processo de conhecimento. 11ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 91-92.
[25] Segundo a lição de CRUZ E TUCCI, "a técnica de invocar precedentes, se bem utilizada, aumenta em muito a previsibilidade da decisão e, portanto, a segurança jurídica. Opera, outrossim, como importante fator a favorecer a uniformização da jurisprudência. Essa função nomofilácica atende também ao interesse público da unidade da jurisprudência". [TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 17].
[26] NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 30ª edição. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 325.
[27] "Art. 335. (...) §2º Quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4o, inciso II, havendo litisconsórcio passivo e o autor desistir da ação em relação a réu ainda não citado, o prazo para resposta correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência".
[28] "Art. 298. (...) Parágrafo único. Se o autor desistir da ação quanto a algum réu ainda não citado, o prazo para a resposta correrá da intimação do despacho que deferir a desistência".
[29] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 01 - teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 9ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 281.
[30] Segundo conceito já trazido pelo artigo 46, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973, "há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo". De modo bem mais simplificado, conceitua também o artigo 114 do novo Código de Processo Civil, nos seguintes termos: "o litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes".
[31] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil, volume I - teoria geral do processo e processo de conhecimento. 8ª edição. São Paulo: Atlas, 2012, p. 529.
[32] NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 30ª edição. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 325.
[33] "Art. 38. A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e firmar compromisso".
[34] "Art. 105. A procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica".
[35] CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, volume IV. Tradução de Hiltomar Martins Oliveira. 2ª edição. São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, p. 676.
[36] "Art. 317. A desistência da ação, ou a existência de qualquer causa que a extinga, não obsta ao prosseguimento da reconvenção."
[37] "Art. 343. (...) §2º A desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta ao prosseguimento do processo quanto à reconvenção".
[38] SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de direito processual civil, volume 01 - processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 390.
[39] SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de direito processual civil, volume 01 - processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 113.
[40] "Art. 26. Se o processo terminar por desistência ou reconhecimento do pedido, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistiu ou reconheceu. §1º. Sendo parcial a desistência ou o reconhecimento, a responsabilidade pelas despesas e honorários será proporcional à parte de que se desistiu ou que se reconheceu."
[41] "Art. 90. Proferida sentença com fundamento em desistência, em renúncia ou em reconhecimento do pedido, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistiu, renunciou ou reconheceu. §1º. Sendo parcial a desistência, a renúncia ou o reconhecimento, a responsabilidade pelas despesas e pelos honorários será proporcional à parcela reconhecida, à qual se renunciou ou da qual se desistiu."
[42] NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 30ª edição. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 131.
[43] "Art. 1.040. (...) §1º A parte poderá desistir da ação em curso no primeiro grau de jurisdição, antes de proferida a sentença, se a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia. §2º Se a desistência ocorrer antes de oferecida a contestação, a parte ficará isenta do pagamento de custas e de honorários de sucumbência. §3º A desistência apresentada nos termos do §1º independe do consentimento do réu, ainda que apresentada a contestação".
[44] "Art. 976. (...) §1º A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente. §2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono."
[45] "Art. 5º. (...) §3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa".
[46] Confiram-se os artigo 569, caput, do Código de Processo Civil de 1973 e 775, caput, do novo Código, que veiculam idêntica regra:
"Art. 569. O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas".
"Art. 775.  O exequente tem o direito de desistir de toda a execução ou de apenas alguma medida executiva."
[47] SOUZA, Bernardo Pimentel. Execuções, cautelares e embargos no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 182.
[48] "Art. 569. (...) Parágrafo único. Na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: a) serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o credor as custas e os honorários advocatícios; b) nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do embargante".
[49] "Art. 775. (...) Parágrafo único.  Na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: I- serão extintos a impugnação e os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o exequente as custas processuais e os honorários advocatícios; II - nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do impugnante ou do embargante."
[50] SOUZA, Bernardo Pimentel. Execuções, cautelares e embargos no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 182.

30 comentários:

  1. Respostas
    1. Cara leitora Eloisa, muito obrigado pela visita ao Blog e pela agradável consideração.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  2. Respostas
    1. Cara leitora Elizangela, muito obrigado pela visita ao Blog e pela agradável consideração.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  3. Ajudou demais, parabéns pelo trabalho, parabéns pelos esclarecimentos de forma didática e clara!

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    1. Caro leitor, muito obrigado pela visita a este Blog e pela agradável consideração. Muito me felicita saber que o artigo lhe foi útil. Estamos sempre à disposição.

      Atenciosamente.

      Augusto Jorge Cury.

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  4. Após pedir desistência antes da homologação pode o autor requerer o prosseguimento do feito e o cancelamento do pedido de desistência?

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    1. Caro leitor, bom dia.
      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.
      Em resposta à sua dúvida, acreditamos ser possível que o autor, após requerer a desistência, e desde que anteriormente à homologação judicial, manifeste-se em sentido contrário, requerendo, então, o prosseguimento do feito.
      Isso porque a desistência é ato de disposição - regido, pois, pelo princípio dispositivo - consistente em direito conferido ao autor, de que esse pode abrir mão antes da produção de seus efeitos. E, uma vez que a desistência, segundo o sistema do Código de Processo Civil, apenas produz efeitos a partir da homologação judicial (a desistência da ação, ao contrário da desistência de recurso, não produz efeitos imediatos), não há óbice a que a parte autora, antes de sobredita homologação, requeira a desconsideração de seu pedido de desistência.

      Espero tê-lo ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  5. Excelente. Didático, objetivo e com muita profundidade.

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    1. Caro leitor José Henrique, agradeço pela visita a este Blog e pela agradável consideração.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  6. Posso desistir de uma ação em face do Estado para repropor em face de sua Autarquia Estadual? Qual a abrangência da renúncia do fundo de direito que pode ser exigida pelo Estado para concordância com a desistência? Alcançaria a Autarquia?

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    1. Cara leitora Andréia, boa tarde.
      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.
      Quanto à sua dúvida: admite-se a desistência da ação proposta contra a Fazenda Pública (Estado, por exemplo). Ocorre que a Lei nº 9.469/97, em seu art. 3º, é expressa em condicionar a aceitação da desistência, pelo ente público réu, à prévia renúncia do direito pela parte autora. Nada obstante as discussões doutrinárias acerca da constitucionalidade desse dispositivo, o Superior Tribunal de Justiça já fixou, em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp nº 1267995/PB - com força de precedente vinculante, nos termos ao art. 927, III, do CPC/2015), o entendimento de que a exigência do art. 3º da Lei 9.467/97 é legítima, podendo o ente público réu utilizar a condicionante de renúncia como fundamento válido a embasar sua negativa à desistência da parte autora.
      Vale recordar, porém, que a regra do art. 3º da Lei 9.467/97 apenas tem incidência para os pedidos de desistência formulados a partir da apresentação da contestação pelo réu, visto que, em momento anterior, a desistência é unilateral, sendo direito subjetivo da parte autora, a que não cabe qualquer oposição do órgão jurisdicional ou da parte ré.
      Desse modo, sempre que se estiver litigando contra a Fazenda Pública, a aceitação de pedido de desistência formulado pela parte autora - desde que após a apresentação da contestação pela entidade ré - fica condicionada à renúncia do direito litigado pela parte autora, hipótese em que, efetivada a renúncia, o processo será extinto com resolução do mérito, nos termos do art. 487, III, c, do CPC/15, fazendo a sentença homologatória coisa julgada. A abrangência da exigência de renúncia, no caso, é total: a aceitação da desistência fica condicionada à renúncia da integralidade do direito pleiteado pela parte autora.
      Entretanto, ao que nos parece, essa renúncia não impediria a parte autora de intentar a mesma ação, com o mesmo pedido e causa de pedir, contra uma Autarquia, ainda que do mesmo nível federativo da entidade estatal que figurava como ré na ação em que se operou a renúncia ao direito. Isso porque, via de regra (sendo exceções as hipóteses de coisa julgada com efeito ultra partes, ou com efeito erga omnes, ou nos casos de substituição processual, ou, ainda, nas ações de estado de pessoa), a coisa julgada apenas é alegável se a nova demanda tiver como elementos, além da mesma causa de pedir e do mesmo pedido, as mesmas partes, o que não acontece se uma ação antes proposta contra a Fazenda Pública Estadual for então proposta contra uma Autarquia Estadual, em vista da autonomia entre o Ente da Federação e as Autarquias por ele criadas (são pessoas jurídicas distintas, com CNPJs diversos).
      Além do mais, todo direito é, em estrutura, uma relação jurídica, dada entre sujeito ativo e sujeito passivo e tendo como objeto uma prestação. Se alterado qualquer desses elementos (sujeito passivo, por exemplo), há relação jurídica diversa e, assim, direito diverso. Isso significa que a renúncia ao direito em relação à entidade fazendária que figura como ré extingue apenas essa relação jurídica material, não tendo o condão de extinguir, portanto, a relação jurídica porventura existente entre a parte autora e a Autarquia Estadual, não extinguindo, por conseguinte, o direito existente em relação a essa Autarquia.
      ... - PROSSEGUE NO PRÓXIMO COMENTÁRIO - ...

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    2. ... - CONTINUAÇÃO - ...

      Cara leitora Andréia, se me permite, deixo aqui, por fim, uma dica prática:
      Se o motivo de sua desistência for a possível ilegitimidade passiva da Fazenda Pública Estadual que figura como ré na ação, o mais interessante seria não formular pedido de desistência, e sim informar nos autos que, melhor analisando os fatos e os documentos juntados aos autos, a parte autora percebeu a ilegitimidade passiva do Estado (ou, se o caso, simplesmente concordar com a ilegitimidade passiva eventualmente alegada em contestação pelo Estado) e requerer a extinção do feito sem resolução de mérito com base na ilegitimidade (art. 485, VI, do CPC/15), pois nesse caso a regra de condicionamento à renúncia do direito não tem cabimento (evitando qualquer eventual problema futuro quanto à coisa julgada) e o processo será extinto sem resolução de mérito, permitindo a repropositura da demanda - o que, veja-se, é o mesmo efeito prático que se busca com a desistência.

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  7. Augusto Boa tarde,

    Tenho uma ação em face do Estado. Ocorre que apos a contestação percebi que na verdade teria que propor a mesma em face de um município. O que faço? Desisto da ação? Concordo com a ilegitimidade? Como ficam os honorários? terei que pagá-los?

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    1. Caro leitor Márcio, boa noite.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Quanto à sua dúvida: se realmente a Fazenda Estadual for parte ilegítima a compor o polo passivo da demanda, o mais interessante seria mesmo buscar a extinção sem resolução de mérito com fundamento na ilegitimidade (artigo 485, VI, do CPC/2015), e não por simples desistência, uma vez que, com isso, evita-se a incidência da regra de condicionamento da aceitação da desistência à renúncia do direito pleiteado (regra prevista no artigo 3º da Lei 9.467/1997), mantendo-se, porém, os mesmos efeitos práticos (extinção sem resolução de mérito, inocorrência de coisa julgada material e possibilidade de repropositura da mesma ação).
      Com relação à verba honorária, mesmo em caso de extinção do feito sem resolução de mérito (seja pela ilegitimidade, seja pela desistência) será ela normalmente devida. No caso, por não haver julgamento do mérito e, assim, não haver sucumbência, aplica-se o princípio da causalidade, segundo o qual fica obrigado ao pagamento dos honorários a parte que deu causa à tramitação da ação judicial - no caso, o autor, seu cliente. Apenas não haverá a condenação ao pagamento das verbas honorárias se seu cliente for beneficiário da Justiça Gratuita (artigos 98 a 102 do CPC/2015) ou se a demanda estiver tramitando pelo Juizado Especial e limitar-se ao juízo de primeiro grau - ou seja, se não for interposto recurso contra a sentença (artigos 54 e 55 da Lei nº 9.099/1995).

      Espero tê-lo ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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    2. Obrigado Augusto. Ajudou muito!

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  8. Boa tarde!
    Augusto Cury, tenho uma ação contra o estado já faz 4 anos. Até agora não teve audiência nenhuma mas foi pra sentença. O que fazer? Posso desistir do processo?
    Pois o meu objetivo nessa ação foi a pra mim conseguir a minha cirurgia,mas não conseguir pela ação do processo. Ja fiz a cirurgia pelo seus. o que fazer?

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    1. Cara leitora Lanny, boa tarde.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Quanto à sua dúvida: imagino que esteja representada em sua ação judicial por um advogado, motivo por que o ideal é que sempre converse com ele para sanar as dúvidas relativas à sua ação - principalmente por se tratar de um caso concreto específico, materializado em autos processuais cujo conteúdo apenas ele conhece com profundidade e em relação ao qual apenas ele pode, portanto, dar um parecer adequado.
      Apenas o que posso lhe esclarecer é que é impossível pedir a desistência da ação se o processo estiver sentenciado: se seu processo estiver concluso para sentença e não houver sido sentenciado ainda, pode-se requerer a desistência, que dependerá da concordância do réu (no caso, do Estado); entretanto, se o juiz já tiver proferido a sentença em seu processo, será incabível o pedido de desistência da ação, sendo possível, no máximo, a desistência de eventual recurso, a critério de seu advogado.
      De todo modo, reitero: converse com seu advogado para tirar as dúvidas que tiver quanto à sua ação judicial. Apenas ele, que conhece especificamente seu processo, terá meios de lhe prestar adequadamente os esclarecimentos necessários.

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  9. Caro Augusto,

    Muito boa a sua análise, obrigada por compartilha-la conosco.

    Tenho uma dúvida: se desisto de uma ação proposta no Juizado Especial Cível, posso propor nova ação (igual) na Justiça Comum? Como fica a questão da "dependência"?

    Obrigada.

    Marcella

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    1. Cara leitora Marcella, boa noite.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Quanto à sua dúvida: a desistência da ação, nos termos do art. 286, II, do CPC/2015, gera a distribuição por dependência ao mesmo juízo em caso de sua repropositura. O Juízo competente para a nova ação, portanto, será o mesmo perante o qual anteriormente tramitou a demanda desistida.
      E não há qualquer óbice a que a regra de distribuição por dependência incida no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, uma vez que as Leis nº 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009 não trazem exceção alguma a essa regra e, mais ainda, sequer regulam a questão relacionada à distribuição de ações anteriormente findadas sem resolução de mérito, sendo o caso de aplicação suplementar da norma sobre distribuição constante do art. 286 do CPC/2015.
      Desse modo, se houver desistência em relação a uma determinada ação que tramita perante o Juizado Especial Cível, a repropositura desta mesma ação deve dar ensejo à distribuição por dependência para a mesma Vara do Juizado Especial Cível, não se admitindo, como regra, a propositura perante o Juízo Cível Comum. E igual solução será, via de regra, a correta ainda que a nova ação seja proposta em litisconsórcio ativo ou passivo com litigantes que não figuravam na ação desistida.
      Parece-nos, entretanto, haver ao menos uma exceção a essa regra: a hipótese de o novo litisconsórcio formado gerar a majoração do valor da causa de modo a ultrapassar o limite máximo dos Juizados Especiais (40 salários mínimos, para o Juizado Especial Cível; ou 60 salários mínimos, para o Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública), caso em que se está excedendo a competência dos Juizados Especiais, havendo, assim, incompetência absoluta - já que, segundo a atual construção jurisprudencial, a competência quanto ao valor da causa nos Juizados é absoluta -, o que torna imprescindível a propositura da ação perante o Juízo Cível Comum.

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  10. posso desistir da açao apos a audiencia de instruçao e julgamento no juizado especial? isso implicará no pagamento de custas ou em razao da lei 9.099 nao prever custas em primeiro grau ficaria isento do pagamento? obrigada.

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    1. Cara leitora, boa tarde.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Quanto à sua dúvida: a desistência pode ser requerida até o momento da prolação da sentença.
      Nos Juizados Especiais, segundo a determinação legal (art. 28 da Lei nº 9.099/1995), a sentença deve ser proferida já na própria audiência de instrução de julgamento. Assim, em sendo observada a regra legal e prolatada a sentença já na audiência de instrução de julgamento, torna-se impossível a desistência da ação após tal audiência.
      Entretanto, por alguma razão, tem-se por corriqueiro que os magistrados dos Juizados Especiais contrariem a regra legal e deixem de proferir sua sentença na audiência de instrução e julgamento, deixando para emiti-la em momento posterior (normalmente, no prazo de 10 ou 15 dias da mencionada audiência). Nesse caso, é plenamente admissível que o autor requeira a desistência da ação após a audiência de instrução e julgamento, desde que, por óbvio, antes de ser enfim prolatada a sentença. Ressalte-se, porém, que, se requerida a desistência da ação após a audiência de instrução de julgamento (e antes da sentença, por certo), sua efetivação dependerá da anuência do réu, uma vez que já ultrapassada a oportunidade da contestação, o que torna a desistência um ato bilateral.
      De todo modo, uma vez que no âmbito dos Juizados Especiais há isenção de custas processuais e honorários em primeiro grau de jurisdição (arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/1995), a desistência da ação (que, lembremos, apenas é possível antes da sentença de primeira instância) não gera qualquer oneração da parte ao pagamento de custas e honorários.

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  11. Prezado,

    Eu posso desistir da ação na justiça comum, sem julgamento do mérito e antes da citação do ré e entrar pelo Juizado Especial?

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    1. Cara leitora Luciana, boa noite.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Quanto à sua dúvida: a desistência da ação, nos termos do art. 286, II, do CPC/2015, gera a distribuição por dependência ao mesmo juízo em caso de sua repropositura. O Juízo competente para a nova ação, portanto, será o mesmo perante o qual anteriormente tramitou a demanda desistida.
      E não há qualquer óbice a que a regra de distribuição por dependência incida no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, uma vez que as Leis nº 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009 não trazem exceção alguma a essa regra e, mais ainda, sequer regulam a questão relacionada à distribuição de ações anteriormente findadas sem resolução de mérito, sendo o caso de aplicação suplementar da norma sobre distribuição constante do art. 286 do CPC/2015.
      Desse modo, se houver desistência em relação a uma determinada ação que tramita perante o Juízo Cível Comum, a repropositura desta mesma ação deve dar ensejo à distribuição por dependência para a mesma Vara Cível, não se admitindo, como regra, a propositura perante os Juizados Especiais.
      Parece-nos, entretanto, haver como excepcionar essa regra em dois casos, relacionados à competência absoluta dos Juizados Especiais: (a) na hipótese de, na nova demanda, ser reduzido o valor do pedido e, assim, minorado o valor da causa, de modo a que a ação, que antes excedia o limite de valor dos Juizados (40 salários mínimos, para o Juizado Especial Cível; ou 60 salários mínimos, para o Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública), passe então a se enquadrar na competência dos Juizados Especiais (nesse ponto, vale notar que a jurisprudência pátria entende que essa competência, embora fixada com base num critério de valor da causa, é absoluta); ou (b) na hipótese de se verificar que a "maior complexidade da demanda" (por exemplo, a necessidade de produção de prova pericial) que fundamentou sua anterior propositura perante o Juízo Cível Comum, na verdade, não existe, o que exigiria sua repropositura no âmbito dos Juizados Especiais, que é absolutamente competente para julgar as causas de "menor complexidade".

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  12. Parabéns pelo conteúdo, muito explicativo e de fácil entendimento.

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    1. Caro leitor, muito obrigado pela visita ao Blog e pela agradável consideração.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  13. Boa noite,Augusto Cury! Belíssima análise quanto ao processo de desistência de uma ação judicial, foi de grande serventia para mim.
    Contudo, permaneço com uma dúvida que não encontrei respostas em sua análise e em outras que pesquise: a Defensoria pública tem poderes para desistir de uma ação pelo autor nos Juizados especiais cíveis?

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    1. Cara leitora Tainá, boa noite.

      Agradeço pela visita a este Blog e pelo contato.

      Pertinentíssima a sua pergunta!

      A legislação nada diz expressamente acerca da específica possibilidade (ou impossibilidade) de desistência de ação pelo Defensor Público. Entretanto, três razões permitem concluir pela possibilidade de desistência pelo Defensor Público, seja no âmbito da Justiça Comum, seja no âmbito dos Juizados Especiais (uma vez que as regras sobre desistência se aplicam normalmente aos Juizados): (a) em primeiro lugar, porque os dispositivos do Código de Processo Civil que tratam da desistência da ação não fazem qualquer ressalva quanto aos advogados públicos (aí incluídos, por certo, os próprios Defensores Públicos), tendo aplicação genérica; (b) em segundo lugar, porque o Defensor Público, tal como o advogado particular, possui um conhecimento técnico que a própria parte, na quase totalidade das vezes, não possui, cabendo a ele, como profissional, a última análise acerca da viabilidade/pertinência ou da inviabilidade/impertinência do prosseguimento de uma demanda; e, por fim, (c) porque a Lei Complementar nº 80/1994, que regulamenta a Defensoria Pública, estabelece, em seu artigo 128, XII, ser efetiva prerrogativa dos Defensores Públicos "deixar de patrocinar ação, quando ela for manifestamente incabível ou inconveniente aos interesses da parte sob seu patrocínio" - ora, se, segundo a lei, o Defensor pode até mesmo deixar de propor uma demanda inconveniente ao interesse do patrocinado, com ainda mais razão se deve reconhecer que ele pode desistir da ação já proposta sempre que a continuidade dessa demanda se mostrar impertinente ou prejudicial ao interesse da parte, segundo os critérios técnicos de análise do Defensor Público.

      Espero tê-la ajudado.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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  14. Respostas
    1. Cara leitora Tainá, muito obrigado pela visita ao Blog, pela agradável consideração e, mais ainda, pelo pertinente questionamento - já que as dúvidas e as questões, principalmente as baseadas na vida prática, sempre enriquecem, em muito, a análise de qualquer tema.

      Atenciosamente,

      Augusto Jorge Cury.

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